revista fevereiro - "política, teoria, cultura"

   POLÍTICATEORIACULTURA                                                                                                     ISSN 2236-2037



 

Monica Loyola STIVAL

O direito na modernidade: notas para uma análise de Foucault e Habermas

 


Foucault distingue razão de Estado e governamentalidade moderna. A primeira racionalidade, que nasce no século XVI e início do XVII, caracteriza-se especialmente pela limitação exterior que o direito exerce face ao Estado. A segunda, que se desenvolve a partir do final do século XVIII, define-se, sobretudo, pela limitação interna operada pela economia política. A pergunta deste artigo, tomando como ponto de partida o diagnóstico de Foucault sobre o sentido da racionalidade governamental moderna, é qual o papel que o direito assume nessa segunda configuração histórica. Se ele não é mais elemento central de limitação do poder público, qual sua natureza e função? E em que medida ele contribui ou é efeito do processo de democratização, se pudermos chamar assim o sentido político das ações de governo que acompanham, após a metade do século XX, o neoliberalismo 1? Farei aqui uma primeira aproximação do tema, partindo do diagnóstico de Foucault e assinalando, ao final, alguns pontos de discordância e proximidade com o diagnóstico de Habermas.

A seguir, estritamente a metodologia reiterada no início do curso Naissance de la biopolitique, talvez tivesse sido preciso mostrar a distinção entre racionalidades de governo a partir dos eventos históricos que a revelam. Para Foucault, as racionalidades em questão diferem dos objetivos imperialistas em jogo na Idade Média, que significava a posição de fins ilimitados pelo poder real em relação aos demais países ou sociedades. Desde a razão de Estado há uma limitação dos objetivos externos - Foucault chama de “autolimitação externa” - correspondente aos aparelhos diplomático-militares mobilizados. “Do tratado de Vestefália à Guerra dos Sete anos - ou, digamos, às guerras revolucionárias que vão introduzir uma dimensão bem diferente -, essa política diplomático-militar vai se pautar pelo princípio de autolimitação do Estado, pelo princípio da concorrência necessária e suficiente entre os diferentes Estados”.2. Assim, passando ao largo da análise estrita da formação e diferença concretas entre essas duas racionalidades quanto às relações externas, Foucault apresenta de pronto seu resultado na forma de uma constatação histórica. De todo modo, não são raras as análises que procuram destacar nas guerras revolucionárias a introdução de uma dimensão diferente em relação à configuração política precedente. Porém, não são raras também as teses que vão em sentido oposto ao de Foucault, ressaltando a função essencial do direito na caracterização dos tempos modernos.
Para além dessa observação quanto ao ponto de partida do curso de Foucault e a metodologia anunciada na primeira aula, é importante notar que, para ele, as diferenças entre a razão de Estado e a racionalidade governamental moderna especificam e definem essas duas grandes racionalidades. Significa que o estatuto da limitação do Estado ou poder público é decisivo. Portanto, segundo Foucault, a “maneira de governar” em jogo em um caso ou em outro é, antes de mais nada, uma decisão sobre o tipo de objetivos, limitados ou ilimitados, que determinada racionalidade põe para si. Seria preciso saber então por que motivo os objetivos ilimitados do poder real na Idade Média teriam cedido espaço aos objetivos mais modestos da razão de Estado, ao menos quanto à política externa. Seria preciso entender também por que os objetivos ilimitados da política interna da razão de Estado - o chamado Estado de polícia - saiu de cena para a entrada triunfante de uma racionalidade que se autorregula.

De todo modo, é verdade que, para Foucault, ele não saiu inteiramente de cena, apenas do centro do palco. É verdade também que a nova protagonista nasce de relações que passaram a organizar concretamente a prática dos homens.3 A economia sofre transformações significativas, que Foucault procura instalar no núcleo dessa nova racionalidade sem, no entanto, deixar de compreender a economia no sentido de uma política de governo, e não no sentido estrito de uma ciência particular, cuja esfera de ação funcionaria como uma infraestrutura das demais esferas de relações políticas. É por isso que Foucault se refere ao mercantilismo como “uma forma de governo” (“o mercantilismo não é uma doutrina econômica”4). A economia política, nesse mesmo sentido, impõe uma agenda política distinta da anterior, mesmo que vise aos mesmos fins, desde que a análise dos fisiocratas conclui que “o poder político devia ser um poder sem limitação externa, sem contrapeso externo, sem fronteira vinda de outra coisa que não ele próprio, e é isso que eles chamaram de despotismo”.5 Significa que a economia passa a ser um saber que impõe uma decisão política sobre os meios de alcançar os objetivos do poder público e, com isso, define a natureza da limitação do poder público. Significa também que a nova racionalidade não nasce como ideal de democracia.

Na apresentação de Foucault, a novidade não é, portanto, própria ao movimento histórico do campo da economia. A transformação ocorrida no final do século XVIII diz respeito, mais amplamente, à racionalidade de governo, a seus objetivos e limitações. Na razão de Estado, a limitação é externa, feita pelo direito, enquanto na razão governamental moderna - entenda-se, no liberalismo - ela é interna, feita pela economia política. Nessa transformação, tal como desenhada por Foucault, o direito cede espaço à economia política no que diz respeito à função desse saber na delimitação dos meios e, num segundo momento, dos objetivos da racionalidade de governo.

Um dos aspectos fundamentais do papel limitador que o direito assume na razão de Estado é que ele vincula uma limitação do Estado, e não pelo Estado, como na Idade Média. Por isso essa limitação é dita “externa” por Foucault. “Em suma, é sempre do lado da oposição que se faz a objeção de direito à razão de Estado e, por conseguinte, se recorre à reflexão jurídica, às regras de direito, à instância do direito contra a razão de Estado. O direito público, digamos numa palavra, é de oposição nos séculos XVII e XVIII”.6 Ao contrário, a autolimitação da racionalidade governamental moderna, o liberalismo, envolve uma limitação de fato, não mais de direito, estabelecendo limites à prática de governo. Está em jogo, portanto, uma medida indeterminada de governo. Há um equilíbrio entre o “excesso de governo” e a “falta de governo” que situa a prática liberal. Talvez se possa pensar, a partir do quadro analítico de Foucault, que um direito social também se equilibraria entre extremos que colocam em perigo a natureza da racionalidade governamental. Por exemplo, caso o programa bolsa-família do governo brasileiro fosse universalizado entre seus cidadãos ou vinculasse valor cem vezes maior, talvez desestruturasse a governabilidade vigente, do que se poderia acusar irresponsabilidade ou má condução, mas não ilegitimidade.

Em todo caso, um aspecto importante a destacar na caracterização que Foucault faz dessa nova racionalidade é que “a divisão (partage) não vai se estabelecer nos indivíduos, nos homens, nos súditos; ela vai se estabelecer na própria esfera da prática governamental”.7 Isso significa que não está em questão uma dimensão privada da vida dos sujeitos que o governo não deveria tocar, espécie de dimensão das liberdades, o que seria uma limitação de direito, mas uma medida da ação do governo na vida social em geral. A medida do governo não depende da dimensão da vida do sujeito que a ação de governo envolve, mas do grau e natureza da ação de governo face à vida social como um todo (população). A palavra-chave é medida justamente porque se trata de equacionar o excesso de governo.8 “Não é ao abuso da soberania que se vai objetar, é ao excesso de governo.”9

A economia política permite a autolimitação do liberalismo porque, entre outras coisas, retira o critério de avaliação do governo da origem ou fundamento de sua ação, da justiça de sua ação, para colocá-lo na ordem dos efeitos, mobilizando as figuras do êxito ou do fracasso. Há um deslocamento temporal, segundo Foucault, no critério de limitação do governo, que vai da origem ao efeito, da justiça ao êxito. Salta aos olhos o caráter jurídico dos primeiros termos (origem e justiça), que não por acaso são recusados pelo positivismo jurídico de Kelsen. Entretanto, ao longo do século XX esses termos são recuperados com bastante eloquência na teoria ou filosofia do direito. De todo modo, a partir da análise que Foucault faz do liberalismo moderno - essa “era da política”10 -, basta notar por enquanto que, segundo ele, “êxito (réussite) ou fracasso (...) são agora o critério da ação governamental, e não mais legitimidade ou ilegitimidade”.11

É imediatamente que se coloca então a questão de saber qual o papel do direito na modernidade liberal. “Em termos claros, o problema que vai se colocar a partir do fim do século XVIII é o seguinte: se há uma economia política, o que acontece com o direito público?”12

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 “Ora, apesar dos esforços que foram feitos para separar o jurídico da instituição monárquica e para liberar o político do jurídico, a representação do poder permaneceu presa nesse sistema.”13 O que significaria, na modernidade, liberar a representação do poder de um sentido jurídico? Por um lado, há certo consenso sobre a necessidade do direito e do respeito às regras de direito para a vida social. Por outro lado, essa representação tende a racionalizar, no modo da legitimidade e da autonomia abstrata, dividida em autonomia privada e autonomia pública, as relações políticas entre os homens. Sabe-se geralmente que uma ação política ilegal pode ser desejada e, mais que isso, pode ser democratizante. Como fundar sua legitimidade? Moralmente? Quando a violência é legítima e ilegal, o que vale mais? Se o direito é meio de democratização, postulada aqui como fim político da sociedade do século XX e XXI, como pensar a democratização do próprio direito? Como avaliar politicamente o conteúdo do direito positivo? Confiando no bom senso e nos valores das definições constitucionais? Parece-me que a política - que é ela mesma democratizante ou não - deve poder medir o valor em jogo no direito positivo. Foucault permite pensar a distinção que mantém política e direito em níveis distintos, embora seu esquema geral pareça pouco frutífero quanto à posição política a ser desempenhada concretamente.14

Foucault permite pensar a política de maneira ampla na medida em que procura se desvencilhar do que chama o “modelo jurídico-teológico” de reflexão sobre o presente. Ao contrário da universalidade implicada pela concepção jurídica de soberania, a economia política é “uma disciplina ateia”, “uma disciplina sem Deus”, ou ainda, “uma disciplina sem totalidade”.15 Significa que, enquanto instrumento intelectual da racionalidade liberal, a economia política inclui o direito, no sentido de que a lógica jurídica é ela própria da ordem do cálculo. Não é a economia política que funciona conforme a lógica jurídica. Por conseguinte, não há possibilidade de um “soberano econômico”. É porque o homem não pode conhecer a totalidade do mundo que, segundo Foucault, a “mão invisível” teorizada por Adam Smith é mais importante em função da invisibilidade do que em função da suposta manipulação absoluta das relações econômicas entre os homens.

Para Foucault, esse é um ponto fundamental na história da razão governamental. A economia política diz ao soberano: “tu também não podes conhecer a totalidade do processo econômico”.16 E é então que nasce o problema político que atravessa a modernidade. Afinal, para Foucault, “todos os retornos, todas as recorrências do pensamento liberal e neoliberal na Europa dos séculos XIX e XX ainda constituem, sempre, certa maneira de colocar o problema dessa impossibilidade da existência de um soberano econômico”.17

Ora, assim como Foucault entende que o “sujeito de interesse” é irredutível ao “sujeito de direito”, mesmo quando aquele participa positivamente do mundo civil (jurídico), ele procura mostrar que o soberano não se sobrepõe à racionalidade econômica. O soberano era a figura totalizante do Estado de polícia (séculos XVII e início do XVIII), e é a diferença em relação à noção de totalidade que estabelece a ruptura entre o Estado de polícia e a governamentalidade moderna. A teoria da mão invisível de Adam Smith, “entendida como desqualificação da possibilidade de um soberano econômico, é a recusa desse Estado de polícia”.18 Significa que ela recusa o mercantilismo em seu sentido político, muito além de uma questão técnica ou teórica. “A economia política de Adam Smith, o liberalismo econômico, constitui uma desqualificação desse projeto político de conjunto e, mais radicalmente ainda, uma desqualificação de uma razão política que seria indexada ao Estado e à sua soberania.”19

A forma de governo particulariza a noção de Estado, e a universalidade pressuposta pelo modelo em que o Estado ocupava o centro da análise abre campo à particularidade das relações econômicas, recolocando na história o princípio de limitação e determinação do campo do verdadeiro e do legítimo. Foucault procura mostrar que é na história que a economia política revela a impossibilidade do conhecimento absoluto e esvazia o sentido clássico de poder, e faz da representação jurídica do poder uma representação. O que não significa, evidentemente, a ausência desse modo de representar o poder no modelo norte-americano. Como nota Kervégan, “o liberalismo é ele próprio um grande consumidor de direito”20, mas o papel da economia política continua irredutível ao direito e, portanto, à “normatividade”.

A discussão norte-americana tomou o liberalismo de tal modo como tema privilegiado - segundo Foucault, enquanto a Europa discutia problemas como “a unidade da nação, ou sua independência, ou o Estado de direito”21 - que um inimigo comum foi combatido tanto pela direita (liberal) quanto pela esquerda (idem). É o “não-liberalismo” de cunho intervencionista que permite, por um lado, a crítica a qualquer política que pareça socialista e, por outro lado, a crítica e prática da esquerda antiimperialista. Segundo Foucault, ambos se voltam contra a possibilidade de um Estado imperialista e militar (sic!). O grande adversário do neoliberalismo norte-americano aparece assim na figura de qualquer política de Estado que pressuponha intervenção econômica ou mesmo social, e contra isso se colocam a direita e a esquerda norte-americanas, estabelecendo uma espécie de tirania da opinião liberal. O neoliberalismo norte-americano é então “reativado, tanto à direita como à esquerda”.22 É essa espécie de consenso de fundo - apresentada por Foucault sem maiores análises concretas... - que permite a Foucault ver o liberalismo norte-americano como “uma maneira de ser e de pensar”.23

Foucault nota que é já no processo de independência dos Estados Unidos que a reivindicação por independência econômica torna-se o centro das relações políticas. Assim como no modelo neoliberal alemão, não é o Estado que toma uma forma liberal, mas o liberalismo que constitui um Estado. “Não é o Estado que se autolimita pelo liberalismo, é a exigência de um liberalismo que se torna fundador de Estado.”24 Por isso mesmo o liberalismo não é alternativa político-econômica, mas disposição ou característica da vida norte-americana. Essa condição histórica do liberalismo nos Estados Unidos, identificado por Foucault, portanto, ao ponto capital de sua independência, faz do foco de suas reivindicações, ou mesmo do eixo de seus valores, não mais a noção clássica de trabalho, mas a de liberdade. É desse vértice de sustentação da política econômica norte-americana que parece nascer a ideia de liberdade como reivindicação global, constituindo um “foco utópico”.
Segundo Foucault, o eixo da questão norte-americana é a liberdade, não o trabalho. A centralidade da noção de trabalho na economia política clássica esteve atravessada sempre pela variável tempo. Significa dizer que é em função do tempo de trabalho ou tempo livre, enquanto variável que determinaria a produção e, assim, a riqueza, que se estrutura a (crítica à) economia política desde Ricardo, Adam Smith, Marx. Essa mesma não-análise do trabalho, já que se dá em função da produção, estaria presente ainda em Keynes.25 O ponto central da discussão feita pelos liberais norte-americanos aponta que o trabalho, pensado em termos de força e tempo, é reduzido a uma fórmula quantitativa que perde aquilo que é real, humano, ou seja, suas variáveis qualitativas. O trabalho é, portanto, abstrato. “E é precisamente porque a economia clássica não foi capaz de se encarregar da análise do trabalho em sua especificação concreta e em suas modulações qualitativas, é precisamente porque ela deixou essa página em branco, essa lacuna, esse vazio em sua teoria, que precipitaram sobre o trabalho toda uma filosofia, toda uma antropologia, toda uma política de que Marx é precisamente o representante.”26.
O contencioso de um país como a França e de um país como os Estados Unidos mostra bem a diferença em questão. Foucault nota que, se os litígios que têm relação de indivíduo a Estado são relativos, na França, a questões de serviço ou de serviços públicos e, portanto, ao trabalho, eles são, nos Estados Unidos, relativos ao problema das liberdades.27 É aí que Foucault encontra o sintoma da diferença de modelos. É em decorrência dessa especificidade do liberalismo norte-americano que ele se revela “um método de pensamento, uma grade de análise econômica e sociológica”.28 O termo liberalismo designa um novo modo de pensar, um êthos. Há uma ideia geral sobre o homem como sujeito econômico, de modo que o homem correlato ao liberalismo não é o sujeito de direito.

Ora, esse diagnóstico levanta, ele próprio, a questão do lugar do direito público. Segundo Foucault, o lugar do direito público se deslocou com a constituição de uma prática governamental atenta às regras internas de mercado. Se a não-intervenção do governo nas leis do mercado é o regime de verdade vigente, resta ao poder público saber como é que ele vai formular o respeito à verdade em termos de lei. Foucault destaca duas vias de formulação sobre a conjugação do liberalismo com o direito público.
A primeira via, dita jurídico-dedutiva, axiomática ou revolucionária, procura pensar a limitação do poder público a partir do direito, isto é, com base na determinação de direitos fundamentais que distinguem o que os indivíduos concordam em ceder e aquilo que reservam para si face ao poder público. Está em questão uma limitação por regras concernentes à origem lícita de uma forma governamental baseada na forma da alienação. Nessa perspectiva, a lei deve refletir a vontade dos indivíduos, de modo que a liberdade tem fundamento jurídico. Essa via envolve certa continuidade em relação à razão de Estado precedente, já que a mudança é redutível a uma lógica única do processo. Ela tem seu centro na dimensão simbólica da vida, e seu correlato é o sujeito de direito.

A segunda via, chamada via indutiva ou residual, é aquela que, para Foucault, aparece efetivamente no desenvolvimento da “razão governamental crítica”. Isso porque ela parte da própria prática governamental e circunscreve o direito público dentro de si mesma. Esse aspecto é essencial para Foucault: trata-se da análise dos limites de fato. O campo de ação restringe-se à utilidade social das ações governamentais - utilidade que será definida, em última instância, pelo próprio mercado e, portanto, pela esfera da economia política e não do direito. Nessa perspectiva, a finalidade não tem fundo simbólico, mas técnico. A limitação jurídica do poder político se mostra então, desde o início, aparente (representação).

Como o direito, no diagnóstico de Foucault, não intervém decisivamente no jogo de verdade, definido pela economia política, a questão da utilidade não é nunca revolucionária - ela não determina a possibilidade de uma razão governamental. A lei reduz-se à transação, ao ajuste entre a esfera de intervenção do Estado e à esfera de independência dos indivíduos, de modo que a independência traçada pelo mercado delimita a liberdade desses indivíduos. A partir dessa segunda via, o nó entre o liberalismo e o direito público está fora do campo de constituição de verdade e falsidade. Esta definição ocorre na relação entre mercado e poder público, entre o princípio de concorrência e o critério de utilidade, do ponto de vista da população, e situa-se na noção de interesse. É nesse modo de organização que se estabelece um “sujeito de interesse”.

Se Foucault mostra que a segunda via é efetiva na prática jurídica do liberalismo, a primeira não é de modo algum abandonada. Contudo, sua inocuidade frente ao regime de verdade instaurado no nível da economia política expressa o hiato intransponível entre, de um lado, a descrição do funcionamento real do poder público e, de outro lado, a forma jurídica evocada como possibilidade de superação desse regime de verdade. De um lado, há a técnica e reflexão que é a economia política; de outro lado, há uma espécie de mitologia humanista (simbólica). No esquema geral de Foucault, positividade versus metafísica. Por aí se pode perceber como, no esquema de Foucault, a via revolucionária é paradoxal em relação ao centro de gravidade do poder político, baseado na economia política e não em um direito público que o determinasse em termos de legitimidade, conforme um princípio crítico exterior e anterior ao jogo das relações de poder.

Assim, para Foucault, ao que parece, toda possibilidade de superação do modelo econômico-político por algo que lhe é externo (como o direito) não pode ter qualquer eficácia, uma vez instaurado o regime de verdade vigente. Partindo do diagnóstico da modernidade liberal, Foucault pensa a transformação fora dessa chave axiomática. Nem por isso se trata, para ele, de reificar o modelo residual. “Se quisermos mudar o poder de Estado, é preciso mudar as diversas relações de poder que funcionam na sociedade.”29 Portanto, para Foucault, o prognóstico, assim como o diagnóstico, não passa essencialmente pelo direito. Mudar as diversas relações de poder não significa, pelo menos não principalmente, luta por direitos.

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Em outro sentido está Habermas, para quem o direito parece cumprir o papel de uma espécie de infraestrutura da democracia. Para falar a partir do quadro conceitual foucaultiano, ele realiza a crítica das “filosofias da consciência” sem sair do quadro da axiomática dos direitos do homem.

Não se trata exatamente de limitar o poder público pelo direito, mas de limitar a própria dinâmica social, na medida em que, para Habermas, o direito serve para “domesticar o potencial de conflito das liberdades subjetivas”.30 Isso porque o direito teria função integradora, desempenhada por meio da “estabilização das expectativas de comportamento”. Significa atribuir ao direito a função de normalização social, legitimando o projeto exaustivo que as diretrizes jurídicas vinculam. Afinal, a “ordem é o que resta quando se houver impedido de fato tudo o que é proibido”.31 Foucault desenvolveu esse aspecto mostrando a diferença essencial entre lei, disciplina e segurança, pois, para Foucault, “a segurança, ao contrário da lei que trabalha no imaginário e da disciplina que trabalha no complementar da realidade, vai procurar trabalhar na realidade, fazendo os elementos da realidade atuarem uns em relação aos outros, graças e através de toda uma série de análises e de disposições específicas”.32 Ora, pensar o direito como “estabilização de expectativas de comportamento” parece uma forma de aliar institucionalmente os dois primeiros mecanismos de governo, recusando a centralidade da segurança - pensada por Foucault como mecanismo chave da economia política, capaz de incluir certa margem de tolerância tida como necessária em função da compreensão dos processos reais.

O direito seria forma privilegiada para aquela estabilização das expectativas de comportamento, pois uma dedução formal revelaria, em Habermas, que “não parece haver equivalente funcional nas sociedades complexas”.33 Significa, em termos foucaultianos, que o direito é a técnica mais eficaz de disciplina. O direito alia lei (negativo) e disciplina (produtivo). Nessa linha, a lei é aspecto negativo das técnicas ou mecanismos de poder vinculados pelo direito, enquanto a disciplina é aspecto produtivo dos mecanismos jurídicos. Porém, pode-se admitir sem dificuldade a necessidade e o interesse em formular direitos, o que alarga o sentido desse campo para além do caráter negativo da lei. Mas o conteúdo da normalização por meio de novos direitos é decisivo. Se entendermos a normalização como efeito inevitável das relações de poder, poderemos ressaltar que a questão decisiva é o valor em jogo nessas relações. Logo, a moral fornece conteúdo concreto à norma jurídica.

Essa relação imediata entre moral e direito está fora de moda há bastante tempo, pelo menos desde Kelsen. Habermas mantém-se na tarefa de limpar o direito de toda fundação moral, o que significa renunciar a identificar “a pretensão à legitimidade das normas jurídicas e a pretensão à justiça moral”.34 Nesse sentido, não demora para que se ponha a pergunta pelo conteúdo da autolegislação, que é para ele o sentido da democracia. A autolegislação não visa à justiça? Que finalidade orienta a formulação do conteúdo da norma? Se a finalidade do direito é estabilizar expectativas de comportamento, é preciso saber que comportamento normal os homens, ou os cidadãos, devem ter. Problema relegado à razão prática, por facilidade teórica que esse nível de abstração parece permitir. Contudo, não são poucos os termos morais ou de moral que aparecem em fórmulas de Habermas como: “O filósofo deveria se contentar com a ideia segundo a qual somente o médium do direito permite, nas sociedades complexas, estabelecer, inclusive entre pessoas que são estranhas / estrangeiras (étrangères) umas às outras, relações moralmente requeridas de respeito recíproco”.35 Deixando para outro momento a pergunta pelo que significa falar em “pessoas estranhas / estrangeiras umas às outras”, para Habermas, a grande vantagem do direito é então de ordem moral, e de uma moral bem precisa, aquela que coloca como valor maior o abstrato “respeito recíproco”.

Assim, está em jogo um direito que “se nutre a um só tempo da ‘moral social democrática’ dos cidadãos e de uma cultura liberal que favorece seu desenvolvimento”.36 É curioso notar que é justamente certa “cultura liberal’’ que, para Foucault, em lugar de favorecer alguma “moral social democrática”, pelo menos no sentido comunicativo-jurídico que Habermas lhe fornece, tem por efeito a produção, no nível do sujeito, de um êthos liberal, isto é, centrado na concorrência. Esse efeito se observa, por exemplo, no tema do “capital humano”.37 Ao contrário, em Habermas, a dimensão ética é pensada na chave da autonomia privada, que mantém, para ele, relação de complementaridade não hierárquica com a autonomia pública. Entretanto, é preciso que os cidadãos façam um uso “orientado para o bem público” de seus direitos de participação e comunicação. “O direito não pode se manter como direito legítimo senão na medida em que os cidadãos saem de seu papel de sujeitos de direito privado para adotar o ponto de vista de participantes nos processos de acordo sobre regras de sua vida em comum”38. Seria uma exigência da postulação da lei moral, mesmo quando a chamada autonomia privada está em conflito com as regras da vida comum?

Para Habermas, o direito responderia, historicamente, à necessidade de integração social, fazendo do direito uma “invenção evolutiva”. Essa tese sofre do que se poderia chamar um prejuízo do estado de natureza, já que pressupõe a necessidade da integração artificial, supõe que os indivíduos são átomos cuja integração social precisa ser garantida, não mais pela teologia ou metafísica, mas pelo direito. Essa tese pode ser avaliada recuperando a tese que Foucault defende quando caracteriza o nascimento do direito moderno, no Estado de polícia, como posição civil contra o Estado.

Segundo Foucault, “essas discussões em torno do direito, a vivacidade dessas discussões e, aliás, o intenso desenvolvimento de todos os problemas e teorias do que poderíamos chamar de direito público, o ressurgimento dos temas do direito natural, do direito originário, do contrato, etc., que tinham sido formulados na Idade Média num contexto totalmente diferente, tudo isso é de certo modo o avesso, a consequência de e a reação a essa nova maneira de governar que se estabelecia a partir da razão de Estado”.39 Pode-se dizer, aproximando Habermas desse diagnóstico da gênese do direito moderno, que “o direito moderno consiste em um sistema de normas positivas coercitivas que têm pelo menos a pretensão de garantir a liberdade”,40 entendendo essa garantia como uma cláusula contra o Estado, uma proteção de liberdades face ao Estado. Mas ao colocar essa gênese em termos lógicos, Habermas perpetua o espírito da contraposição à razão de Estado como racionalidade inerente e decisiva do neoliberalismo, nas chamadas sociedades pós-tradicionais, além de retirar o sentido conflituoso que a gênese histórica confere ao nascimento do direito, nos termos de Foucault. Em Habermas, nasce o direito moderno: a um só tempo, nasce a “autonomia privada” e a “autonomia pública”, isto é, os direitos de liberdade e de autodeterminação e os direitos de comunicação e participação.

Ao perpetuar o prejuízo do estado de natureza como pressuposto explicativo da integração social na modernidade liberal, Habermas mantém a distinção de legitimidade para as ações de governo, assim como a divisão entre o que é ou não a fazer no nível do sujeito. Distinguir logicamente autonomia privada e autonomia pública significa pressupor uma distinção metafísica no nível do sujeito. Para Foucault, ao contrário, a racionalidade liberal “não cinde os súditos numa parte de liberdade reservada absolutamente e numa parte de submissão imposta ou consentida”.41 O equívoco histórico de pressupor kantianamente essa distinção para, então, analisar as sociedades complexas, derivando a ordem empírica de certa estrutura lógica ou possibilidade semântica, parece sustentar a distinção habermasiana entre direito e moral. Portanto, a crítica a essa pressuposição recoloca o problema da relação entre moral e direito.

O correlato do prejuízo do estado de natureza, entendido como pressuposição da condição desintegrada da sociabilidade não-jurídica (nem especificamente teológica ou metafísica), é o prejuízo do contrato social, ou seja, da autolegislação.42 Trata-se da complementaridade entre o que Habermas chama teoria social e teoria do direito. Para uma teoria social que exige uma integração artificial e codificada corresponde uma teoria do direito que faz da própria integração a formulação do código. “É assim que um modelo da discussão ou da deliberação vai se substituir àquele do contrato”.43 Os homens não vão assinar qualquer coisa, cheque em branco para um soberano, mas discutir e deliberar, isto é, assinar um cheque com conteúdo definido, tornando os cidadãos seu próprio soberano. Assim, “com efeito, a comunidade jurídica não se constitui por meio de um contrato social, mas em virtude de um acordo estabelecido por meio da discussão”,44 o que muda pouco quanto à estrutura do problema.

A combinação entre teoria social e teoria do direito nesses termos responde a um diagnóstico que merece ser analisado criticamente, mas só posso indicar aqui alguns aspectos. Assim como para Foucault, para Habermas a sociedade moderna nasce com o fim da moral de código. Segundo Foucault, “por toda uma série de razões, a ideia de uma moral como obediência a um código de regras está, agora, desaparecendo, já desapareceu”,45 o que dá espaço ao que Habermas chama “moral pós-tradicional”, esse “contexto pós-metafísico”. Vale notar que, diferentemente da Europa do final do século XX, não é nem um pouco óbvio que possamos nos referir ao mundo presente, no Brasil do século XXI, como espaço público liberto de toda moral de código, esse temido estado “primitivo”. Significa estar aquém do neoliberalismo norte-americano, em Foucault, e aquém da democracia,46 em Habermas. Entretanto, em ambos, esse diagnóstico depende não apenas que se ignore a prática teológica ou metafísica que orienta ações sociais coletivas, mas o próprio caráter moral do direito. O direito não vincula valores morais ao generalizar e formalizar regras sociais?

Em Habermas, o diagnóstico do fim da moral de código aparece em termos de legitimidade das normas. “Essa questão torna-se mais aguda, notadamente, nas sociedades pluralistas nas quais as visões de mundo inclusivas e as éticas dotadas de força obrigatória coletiva são desintegradas e nas quais a moral pós-tradicional que subsiste, e que é fundada na simples consciência moral de cada um, não oferece mais base suficiente para fundar um direito natural, outrora legitimado pela religião ou pela metafísica.”47 Ele implica a posição de uma moral fundada apenas “na consciência moral de cada um”, no mesmo sentido em que Foucault, ao forjar o mesmo diagnóstico, abre a possibilidade de pensar uma “estética da existência”, pois “a essa ausência de moral responde, deve responder uma busca que é aquela de uma estética da existência”.48 Mas por que o mesmo diagnóstico suscita em um a necessidade de nova integração por meio do direito, um novo campo a cumprir a função deixada vazia, e, no outro, o alívio de uma condição potencialmente menos assujeitada?

O diagnóstico de Foucault baseia-se inteiramente na crítica ao modelo jurídico-teológico, de modo que ele exemplifica a nova condição moral com a análise do neoliberalismo norte-americano, naquilo que ele tem de diferente em relação ao modelo alemão.49 Ele é índice do interesse dessa maneira de governar, ou pelo menos constatação de um ponto de partida concreto para a análise do sujeito moral moderno. Em Habermas, o ponto de partida análogo é condição do princípio democrático e, por isso, do direito. Mas isso apenas porque a passagem do diagnóstico do fim da moral para a resposta necessária a essa ausência é comunicacional, enquanto em Foucault ela é concorrencial. Quer dizer, a maneira como as relações entre os homens - órfãos da moralidade integradora - se estabelece na modernidade é pensada por Habermas a partir da condição de possibilidade da comunicação (no plano da experiência possível), enquanto Foucault a pensa a partir da natureza intrinsecamente conflituosa dessas relações (no plano da história concreta). É apenas o reconhecimento da concorrência como essência da modernidade liberal que permite a afirmação que encontramos em Guénaire, segundo a qual “o liberalismo é uma moral”.50

Foucault procura mostrar, nesse sentido, que o neoliberalismo norte-americano se define pelo êthos da concorrência, não do acordo - mesmo que este possa ser logicamente viável do ponto de vista da comunicação. Por isso, para Foucault, o direito é regulamentação de conflitos, em alguma medida necessária, mas ele não é de modo algum a maneira pela qual a sociedade quer e deve regular todos os conflitos, pressupondo a possibilidade de universalização desse apaziguamento, o que depende de esvaziá-lo de todo conteúdo moral. Afinal, é apenas nessa medida que o conteúdo concreto do razoável pode ser imaginado ou postulado como universal. Como diz Habermas, “certamente, a moral e o direito servem, um e outro, a regular os conflitos entre pessoas”;51 mas o problema é imaginar que a parcialidade da moral deve ser subjugada à suposta universalidade do direito.

Bibliografia

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FOUCAULT, M. Dits et écrits (1954-1988), 2 volumes, Paris: Gallimard, 2001.
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___________. Sécurité, territoire et population: Cours au Collège de France (1977-1978), Paris: Hautes Études, Gallimard, Seuil, 2004. [Segurança, Território, População, tradução de Eduardo Brandão, revisão de Cláudia Berliner, São Paulo: Martins Fontes, 2008]
GUÉNAIRE, M. Les deux libéralismes, Lonrai: Perrin, 2011.
HABERMAS, J. Le discours philosophique de la modernité, Paris:Gallimard, 1988.
HABERMAS, J. Droit et Démocratie. Entre faits et normes, tradução de Rainer Rochlitz e Christian Bouchindhomme, Paris: Gallimard, 1997.
KERVÉGAN, J.-F., Aporia da Microfísica. Questões sobre a governamentalidade. In: Tensões e passagens. Filosofia crítica e modernidade. Uma homenagem a Ricardo Terra. São Paulo: Singular, 2008.









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ilustração:Rafael Moralez



1A diferença que Foucault traça entre o neoliberalismo norte-americano e o neoliberalismo alemão pode servir de base para uma discussão sobre a natureza da democracia nesses dois países, já que, para ele, as políticas de bem-estar social que aparecem na Alemanha pós-guerra não têm analogia com a política estritamente neoliberal do governo norte-americano, no mesmo período. Para Foucault, há uma radicalidade no modelo norte-americano, em contraposição à ambiguidade do modelo alemão, derivada da combinação, neste último, entre perspectiva neoliberal e política social. &ldquo;Em relação a essa ambiguidade, digamos assim, do ordoliberalismo alemão, o neoliberalismo americano se apresenta evidentemente com uma radicalidade bem mais rigorosa ou bem mais completa e exaustiva&rdquo; (Foucault, <em>Naissance de la biopolitique</em>, doravante NB, p. 333; p. 248 - trata-se da paginação da tradução brasileira seguida pela paginação original).

2 NB, p. 10; p. 8.

3 Sobre a mudança do mercado, cujo foco passa do &ldquo;preço justo&rdquo; ao preço &ldquo;natural&rdquo;, ou &ldquo;preço normal&rdquo;, cf. a aula do dia 17 de janeiro de 1979, particularmente as páginas 31, 32 e 33.

4 NB, p. 8; p. 7.

5 NB, p. 20; p. 16.

6 NB, p. 13; p. 11.

7 NB, p. 16 (aqui não segui estritamente a tradução brasileira); p. 13.

8 Nessa &ldquo;arte de governar entre um máximo e um mínimo&rdquo; (NB, p. 40; p. 29) os direitos sociais do século XX podem ser compreendidos como passagem do mínimo ao máximo de governo possível, sem transpor as barreiras do liberalismo. O Estado de bem-estar não é, afinal, revolucionário.

9 NB, p. 18; p. 15.

10 NB, p. 24; p. 20.

11 NB, p. 23 (aqui não segui estritamente a tradução brasileira); p. 18.

12 NB, p. 52; p. 39.

13 Foucault, <em>Histoire de la séxualité I</em>, p. 85; p. 116 - trata-se aqui também da paginação da tradução brasileira seguida pela paginação original.

14 Daqui em diante, até o final dessa segunda seção, retomo o desenvolvimento do tema em Foucault tal como formulei em minha tese de doutorado &ldquo;Foucault entre a crítica e o nominalismo&rdquo;.

15 NB, p. 383; p. 285-286.

16 NB, p. 385; p. 287.

17 NB, p. 385; p. 287.

18 NB, p. 386; p. 287.

19 NB, p. 386; p. 288.

20 Kervégan, <em>Aporia da microfísica: questões sobre a governamentalidade</em>, p. 85.

21 NB, p. 300; p. 223.

22 NB, p. 301; p. 224.

23 NB, p. 301; p. 224.

24 NB, p. 300; p. 223.

25 Cf. NB, p. 302ss; p. 225 ss.

26 NB, p. 305; p. 227-228.

27 Cf. NB, p. 301; p. 224. Esse dado não é explicitado por Foucault.

28 NB, p. 301; p. 224.

29 Foucault, <em>Dits et Écrits II</em>, <em>La société disciplinaire en crise</em>, p. 533.

30 Habermas, <em>Droit et démocratie</em>, doravante DD, p. 493.

31 Foucault, <em>Sécurité, Territoire, Population</em>, doravante STP, p. 60; p. 47 - trata-se aqui, mais uma vez, da paginação da tradução brasileira seguida pela paginação original.

32 STP, p. 62; p. 49.

33 Habermas, DD, p. 491.

34 Habermas, DD, p. 491.

35 Habermas, DD, p. 491; grifo meu.

36 Habermas, DD, p. 492.

37 NB, p. 318; p. 238.

38 Habermas, DD, p. 492.

39 NB, p. 13; p. 10-11.

40 Habermas, DD, p. 477.

41 NB, p. 16; p. 13.

42 Um ponto crítico que essa correlação traz é saber até que ponto uma crítica da autolegislação (autonomia pública), tal como formulada por Catherine Colliot-Thélène em <em>Démocratie sans &lsquo;demos</em>&rsquo;, pode passar sem a crítica à noção de direitos subjetivos (autonomia privada), mantido por Colliot-Thélène, e, com isso, redundar na dissolução dessa dualidade abstrata.

43 Habermas, DD, p. 479.

44 Habermas, DD, p. 479.

45 Foucault, <em>Dits et Écrits II</em>, <em>Une esthétique de l&rsquo;existence</em>, 357, p. 1551.

46 O princípio democrático depende fundamentalmente daquele diagnóstico, já que é apenas nessa situação que a discussão não é subjugada por preconceitos &ldquo;não racionais&rdquo;. Para Habermas, &ldquo;o procedimento democrático permite o livre jogo de temas e contribuições, informações e razões, ele assegura à formação da vontade política seu caráter de discussão e justifica assim a suposição falibilista de que os resultados obtidos graças a esse procedimento são mais ou menos razoáveis&rdquo; (Habermas, DD, p. 478).

47 Habermas, DD, p. 478.

48 Foucault, <em>Dits et Écrits II</em>, <em>Une esthétique de l&rsquo;existence</em>, 357, p. 1551.

49 O modelo alemão atualizaria o espírito da moral de código ao crer que seria necessário completar ou &ldquo;aquecer&rdquo; a frieza do liberalismo econômico com políticas sociais - morais - de agregação social. Assim, a <em>Vitalpolitik</em> &ldquo;terá por função compensar o que há de frio, de impassível, de calculista, de racional, de mecânico no jogo da concorrência propriamente econômica&rdquo; (NB, p. 333; p. 248). Uma resposta ao problema assim colocado é a postulação da integração, outra resposta, ao estilo habermasiano, é a dedução do direito como instituição privilegiada para essa função necessária. Ou bem se postula que os homens são &ldquo;naturalmente enraizados e socialmente integrados&rdquo;, uma vez que &ldquo;moral e sociologicamente, a concorrência é um princípio mais dissolvente do que unificante&rdquo; (Röpke, <em>La crise de notre temps</em>, p. 236 <em>apud</em> NB, p. 333; p. 248), ou bem se deduz que &ldquo;em razão de suas características formais, o direito positivo que descobrimos na modernidade, por assim dizer como resultado de um processo social de aprendizagem, se recomenda como meio apropriado para estabilizar expectativas de comportamento&rdquo; (Habermas, DD, p. 491). De um modo ou de outro, parte-se da <em>valoração negativa</em> da condição moral pretensamente identificada na sociedade moderna - algo deve &ldquo;responder&rdquo; a ela.

50 Guénaire, <em>Les deux libéralismes</em>, p. 17.

51 Habermas, DD, p. 481.